Moda

Genesis e Peter Gabriel: moda e surrealismo nos primórdios do rock progressivo

quinta-feira, setembro 29, 2016


Por Rafaella Britto -


Expoente da música mundial, a banda britânica Genesis marcou a história do rock no início da década de 1970. De maneira geral, conhecemos Genesis por sua mais recente formação, que tem como líder o ex-baterista Phil Collins. Com hits como “Invisible Touch”, o grupo conquistou grande sucesso comercial e afirmou-se no cenário pop dos anos 1980.
Mas o que poucos sabem é que, inicialmente, o Genesis estava muito longe de ser mainstream: em seus primeiros álbuns, marcados pelo experimentalismo e instrumentação elaborada, a banda narra histórias fantásticas de cunho poético, sombrio, filosófico e surrealista. Nos palcos, estas histórias eram ilustradas pelas performances teatrais do vocalista e frontman Peter Gabriel, que causou impacto pela criação de personas enigmáticas.

O Genesis em sua formação clássica. Da esquerda para a direita: Phil Collins, Peter Gabriel, Mike Rutherford, Steve Hackett e Tony Banks (Foto: Reprodução/Tumblr)

A banda foi descoberta em fins da década de 1960 pelo produtor Jonathan King, e, em 1969, lançou “From Genesis to Revelation”. Neste primeiro álbum, os adolescentes estudantes da Charterhouse School já davam mostras de seu talento para a orquestração de sons revolucionários. Seguiram-se, então, os álbuns “Trespass” (1970) e “Nursery Crime” (1971).

(Foto: Reprodução) 

Entretanto, os primeiros discos foram fracassos comerciais. Esta série de insucessos levou a banda a explorar mais amplamente as experimentações instrumentais e encontrar sua identidade. Decididos a afirmarem-se no cenário musical, o Genesis lança “Foxtrot” (1972), álbum conceitual que possui obras-primas como a canção de 23 minutos “Supper’s Ready”.


MESTRE DO DISFARCE

Em um dos shows da turnê de “Foxtrot”, Peter Gabriel fez sua primeira aparição cênica nos palcos: personificando a imagem da capa do álbum, Gabriel, sem que os outros membros da banda soubessem, surgiu em uma enorme cabeça de raposa e um vestido vermelho de decote profundo, que pertencia a sua esposa. O figurino fazia alusão a um dos trechos da música “Supper’s Ready”: “Open your eyes, it’s full of surprises/Everyone lies, like the fox on the rocks”.

Personificando a imagem da capa do álbum "Foxtrot", Peter Gabriel apareceu no palco com um vestido vermelho de Ossie Clark e uma cabeça de raposa customizada (Fotomontagem/Império Retrô)

“Enquanto eles ficavam afinando as guitarras de 36 cordas, eu ficava com o trabalho de preencher os longos silêncios dos shows”, contou Gabriel ao site Uncut, em 2012. “Eu achei que podia manter a atenção do público sem que todos saíssem entediados para o bar. Para entreter a audiência, eu contava histórias. Comecei a usar asas de morcego e outras coisas, e fui me tornando cada vez mais estranho. Então, na turnê de Foxtrot, eu usei uma cabeça de raposa e um vestido vermelho. Minha esposa, Jill, tinha um vestido de Ossie Clark que servia em mim e tínhamos uma cabeça de raposa customizada. A primeira vez que eu tentei isso foi em uma arena de boxe, em Dublin, e foi um silêncio sepulcral. Você podia sentir o terror.”

As inúmeras personas de Peter Gabriel (Fotomontagem/Reprodução)

A caracterização performática de Peter Gabriel impressionou o público e, pela primeira vez, o Genesis atraía a atenção para si e se consagrava como uma das mais aclamadas bandas de todos os tempos e expoente do chamado “rock arte”, que alia narrativas cantadas, experimentalismos sonoros e teatralidade.
A partir dos álbuns “Selling England By The Pound” (1973) e “The Lamb Lies Down On Broadway” (1974), Peter Gabriel desenvolveu a criação de personas que constituíram a identidade dos primeiros anos do Genesis: ao fim das performances ao vivo da música “The Waiting Room”, podia-se ver, atrás de uma tela, a silhueta de Gabriel, dançando vestido como a ‘Morte’; com o rosto coberto por forte maquiagem, olhos demarcados de preto e cabeça parcialmente raspada, o cantor vestia fantasias de cavaleiros, asas de morcego e máscaras de flores.

Maquiagem carregada a cabeça parcialmente raspada eram a marca do estilo de Peter Gabriel no palco (Fotomontagem/Reprodução)

A "Flor" de "Supper's Ready" (Fotomontagem/Reprodução)

"Slipperman", personagem da música "Colony of Slipperman". Este foi o figurino mais odiado por Phil Collins durante a turnê de "The Lamb Lies Down On Broadway" (Fotomontagem/Reprodução)

"Old Man", personagem de "The Musical Box" (Fotomontagem/Reprodução)

"White/Silver Man", de "Supper's Ready" (Fotomontagem/Reprodução)

"Reverendo", de "The Battle of Epping Forest" (Fotomontagem/Reprodução)

A banda, entretanto, desaprovava as extravagâncias do vocalista. “Eles achavam que eu estava banalizando a nossa música”, conta Gabriel. “Mas eu achava que nós devíamos ter humor e diversão, e aproveitar isso. O público se envolveu – não todos, mas a maioria. O Genesis era muito democrático, mas eu sabia que era capaz de envolver com os figurinos. Quando nós tocamos no Rainbow, durante a turnê de The Lamb Lies Down On Broadway, a banda não viu os figurinos até que eu chegasse para os ensaios. Se eu os colocasse para votação, não teria a menor chance.”

"Britannia", de "Dancing With The Moonlight Night" (Fotomontagem/Reprodução)

"The Magog", de "Supper's Ready" (Fotomontagem/Reprodução)

Outros figurinos de Peter Gabriel (Fotomontagem/Reprodução)

Outros figurinos de Peter Gabriel (Fotomontagem/Reprodução)

"Rael", de "The Cage" (Fotomontagem/Reprodução)

"Lawn Mower" (Cortador de Grama), de "I Know What I Like" (Fotomontagem/Reprodução)

Motivado por razões pessoais e pelos constantes desentendimentos com a banda, Peter Gabriel deixou o Genesis em 1975 e partiu para carreira solo, seguindo a linha pop e menos conceitual pela qual é conhecido na atualidade. “Eu odiava ter minha vida planejada”, explica. “Eu achava que não tinha tanto espaço para ser independente. E os médicos achavam que minha filha recém-nascida, Anna, não sobreviveria. Nós estávamos para gravar The Lamb Lies... no País de Gales e ela estava em Paddington. Não há nada mais importante do que a família, mas a banda era insensível e achava que não devia esperar enquanto eu lidava com questões de vida ou morte. Tivemos algumas conversas sobre isso, mas havia um veneno entre nós. Também havia ciúmes e ressentimentos por causa da atenção que eu estava atraindo como frontman”.


You Might Also Like

2 comentários

Sobre

Criado em 2010 por Rafaella Britto, o blog Império Retrô aborda a influência do passado sobre o presente, explorando os diálogos entre arte, moda e comportamento.


Entre em contato através do e-mail:


contato.imperioretro@gmail.com

Termos de uso

Os textos aqui publicados são escritos e/ou editados por Rafaella Britto e só poderão ser reproduzidos com autorização prévia da mesma (Lei do Direito Autoral Nº 9.610 de 19/02/1998). Produções e materiais de terceiros são devidamente creditados. As imagens ilustrativas são coletadas a partir de locais diversos e são empreendidos todos os esforços para encontrar seus autores/detentores e creditá-los. Se você, artista ou pessoa pública, teve sua imagem utilizada sem autorização, entre em contato e prontamente iremos creditá-la ou retirá-la de nossa publicação.