Comportamento

O estilo Beatnik: a atitude da contracultura

sexta-feira, janeiro 12, 2018



Por Larissa Oliveira –

O período pós-Segunda Guerra Mundial teve forte impacto na cultura americana. A alta sociedade se esbaldava na prosperidade capitalista consumindo produtos em massa. A produção Hollywoodiana traduzia os novos valores e costumes por meio de seus filmes. A elegância das ladylike e a compostura dos gentlemen era modelo a ser seguido. O ideal do sonho americano era propaganda fiel da classe mais alta. Christian Dior vestia as mais exuberantes atrizes de seu tempo. Os vestidos e saias rodadas, as joias e luvas faziam parte do estilo de personalidades como Grace Kelly e Rita Hayworth. Ao mesmo tempo em que esses ideais eram impostos, houve um grupo que se rebelou contra os padrões.

Jovens beatniks (ou hipsters) em Nova York em 1959 (Foto: Burt Glinn/Magnum/ATI)


A geração da contracultura perdurou durante as décadas de 1950 e 1960 e seu estilo de vida foi primeiramente inspirado pelos escritos progressistas da Geração Beat, um pequeno grupo de escritores que produziu obras que versavam contra as limitações, as amarras do sistema vigente. Experiências que não corroborassem com tal sistema partiam de diversas ordens, principalmente da música, da moda e da literatura.

Jovem beatnik à porta do Gaslight Café em Nova York, 1959 (Foto: Bettmann/Getty Images/ATI)

No fim da década de 1950, a Guerra Fria estabelece uma disputa pelo poder entre EUA e União Soviética. A revista Look lança uma edição em que o termo Beatnik se torna popular, numa alusão à ascensão do satélite soviético Sputnik.

Beatniks em Greenwich Village nos anos 50 (Foto: Bettmann/Getty Images/ATI)


O jazz que soava nos bairros boêmios era a trilha sonora. A atração pelo estilo de vida que foge ao materialismo, em que alucinógenos oferecem inspiração para além da formalidade, em que as roupas demarcam o despojamento contrário à sofisticação burguesa, foi traduzida no visual dos artistas da época.

Festa típica de beatniks em Greenwich Village.  A dança geralmente conduzida por jazz, tinha teor sensual e foi captada em filmes como On the road (2012); E Deus Criou a Mulher (1957) e Funny Face (1957) (Foto: Reprodução) 


Em 1969, a autora beat Diane di Prima escreveu um relato erótico da sua experiência no movimento intitulado Memoirs of a Beatnik. Desde jovem ela sabia que não se encaixava nos moldes regulares destinados às mulheres. Sua poesia era libertária e declamada em bares e locais que mais tarde seriam popularizados por poetas como Bob Dylan. Sua escrita e sua imagem denotavam aspectos feministas e, portanto, as mulheres que se expressavam através do estilo beatnik acabavam desafiando imposições e transpiravam a transgressão do seu tempo.

A escritora Diane di Prima, autora do livro "Memórias de uma Beatnik", foi uma das principais vozes femininas da Geração Beat (Foto: Reprodução)


O centro do estilo de vida beatnik era o bairro de Greenwich Village, em Nova Iorque. Os bares, cafés e ruas eram povoados por artistas, estudantes e escritores que declamavam sua poesia revolucionária; jovens que dançavam jazz e folk. Café, cigarros, conversa intelectual, roupas monocromáticas e óculos escuros tornaram-se marca dos hipsters – nome que passou a substituir o termo beatnik. O termo “hipster” já existia e foi visto anteriormente no poema O Uivo, de Allen Ginsberg.

Leitura de poesia em Greenwich Village. Camisas brancas, pretas e listradas de manga curta eram predominantes entre os homens (Foto: Reprodução)


O beatnik entrou em declínio a partir da década de 60, e o engajamento político foi retratado por outra geração da contracultura: os hippies.

ESTILO

O visual beatnik é marcado pela androgenia. Desde boinas e tops com colarinho a camisas listradas e calças pretas, os beats transmitiam mensagens similares através do estilo.

A cantora Patti Smith (Foto: Reprodução)

Bob Dylan (Foto: Reprodução)


Britt Ekland, Michelle Philipps e Edie Sedgwick (Foto: Reprodução)


A estética beatnik marcou o início de bandas como os Beatles, cujo nome foi inspirado nos escritores daquela geração. Para a capa do álbum With the Beatles (1963), foi sugerido que a foto fosse inspirada nas imagens preto e branco do aclamado músico do bebop, John Coltrane. A gola alta e preta, conhecida como turtleneck ainda seria vista na capa de Rubber Soul (1965).

Os Beatles (cujo nome foi uma homenagem aos escritores da Geração Beat) foram responsáveis por popularizar a gola alta conhecida como "turtleneck" (Foto: Reprodução)


Na parte feminina, a artista francesa Françoise Hardy foi uma das que mais aderiram às vestimentas beatnik.

A cantora francesa Françoise Hardy (Foto: Reprodução)


A francesa Jean Seberg adotou um corte de cabelo até então considerado masculino no filme Acossado (1960), de Godard. Sua personagem também veste listras e calças capri.

O visual beatnik de Jean Seberg em Acossado (dir. Jean-Luc Godard, 1960) (Foto: Reprodução)

Outra musa de Godard que apostou no estilo foi Brigitte Bardot. Em Le Mépris (1963), a atriz veste listras e saia lápis preto. A demarcação da silhueta através das saias e calças de brim conferiam uma maior liberdade feminina.

Brigitte Bardot em Le Mépris (dir. Jean-Luc Godard, 1963) (Foto: Reprodução)


Na década de 90, o desenho Doug, da Nickelodeon, trazia a irmã do protagonista Judy Funnie, como uma adolescente beatnik fora do seu tempo. Seu estilo era composto por um Beret roxo, camisa de manga longa e calça preta e óculos escuros. Sua revolta contra o sistema e a cultura do seu tempo acabou por defini-la como hipster.

Judy Funnie, personagem do desenho "Dougie", é uma beatnik fora de seu tempo (Foto: Reprodução)


Sobre a autora:


Larissa Oliveira é professora, escritora e ativista. Apaixonada pela França, anos 90 e Geração Beat. É editora do zine I Wanna Be Your Grrrl e escreve sobre música, cinema e literatura em seu blog pessoal. Também mantém um blog no Medium e colabora frequentemente com outras publicações, como Cine Suffragette


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Criado em 2010 por Rafaella Britto, o blog Império Retrô aborda a influência do passado sobre o presente, explorando os diálogos entre arte, moda e comportamento.


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